Em seus estudos de política, John Locke considera o Legislativo o órgão Supremo do Estado e, na Constituição Americana, ele figura em primeiro lugar entre os Três Poderes. Esta grandiosidade fica evidenciada por meio de sua grande função: falar em nome do povo. Na verdade, este é o ideal que deve nortear nossa prática enquanto representante da sociedade. A organização do Legislativo tem o tônus democrático, porque reúne maioria e minoria e onde o confronto das idéias e a crítica pública estão sempre presentes, evidenciando sua característica democrática.
Na era medieval, os parlamentos se reuniam a partir da convocação do rei e podiam firmar vontade própria, independente do soberano, desde que a maioria encontrasse um consenso. Estes Parlamentos eram formados pela nobreza e o clero, as pessoas influentes, que falariam pelo povo de sua região.
Esta gênese do parlamento evoluiu e na Grã-Bretanha oitocentista os liberais defendiam o direito de que todos fossem representados, com base numérica da população, e não apenas a partir dos que tinham terras e riquezas. O cidadão passou a ser a unidade básica da política democrática, o equivalente a um homem, um voto.
No absolutismo, a vontade do rei era a lei. O soberano exercia, portanto, todas as funções estatais que, em momentos históricos diferentes, foram divididas e entregues a órgãos distintos. A Declaração da Independência Americana e a Revolução Francesa iniciaram a transferência do poder do soberano para o povo.
Este entendeu que o poder utilizado pelos seus representantes também deveriam implicar em atividades governativas. E uma controlaria a outra por mecanismos constitucionalmente estabelecidos. Legislativo, Executivo e Judiciário nasceram dessas concepções. Em sua base estava a idéia de preservação dos direitos individuais.
A separação de poderes, portanto, é o primeiro instrumento constitucional destinado a garantir direitos dos cidadãos e a participação de todos no processo governativo. Embora se faça a correlação entre governo e Poder Executivo, o Legislativo é o primeiro dos poderes. É o deflagrador da atividade jurisdicional. Sem a sua atuação, os demais não subsistem.
O Legislativo é o produtor do ato geral. Originalmente, os Parlamentos não tinham a função principal de fazer leis, mas apenas e tão somente de autorizar a coleta de fundos para o rei e fixar fórum para reclamações. Esta última função, contudo, conservamos até hoje, porque os vereadores e deputados ainda formam o canal de comunicação entre a sociedade e o Executivo, seja municipal ou federal. Ele humaniza o impessoalismo do Poder Público, encaminhando e buscando viabilizar as demandas da população.
O trabalho legislativo começa no Município, na Câmara Municipal, onde o sentimento de valorização do bem estar local é a força matriz do trabalho dos vereadores. Cada Município dispõe de, no mínimo, nove vereadores para legislar.
Para atender às necessidades em setores básicos, como educação, segurança e saúde, o prefeito carece do amparo de legislação enxuta e harmônica, capaz de lhe conferir melhor operacionalidade e maior agilidade. Este é o papel que cumpre ao Legislativo desempenhar.
Desde a Constituição de 1988, o Município mudou. Tornou-se mais autônomo, mais capaz. Convém recordar que a autonomia política significa a capacidade conferida a certos entes para legislarem sobre negócios seus e por meio de autoridade própria. O fato de o Município passar a reger-se por lei orgânica significa a detenção de um poder de auto-organização que antes lhe era negado.
Ganhou a prerrogativa de firmar sua própria Constituição. Os instrumentos foram dados e, politicamente, cabem aos prefeitos e vereadores utilizarem-nos devidamente em proveito da população.
O vereador tem importância fundamental porque é no Município que os cidadãos moram e trabalham. A relevância dos Municípios pode ser mensurada através de uma pesquisa de opinião realizada pelo Ibope, na qual se apurou que 55% dos brasileiros entrevistados apontaram ser as prefeituras a esfera de governo mais importante no seu dia a dia. Quando o cidadão levanta-se pela manhã e dirige-se ao trabalho em transporte público, deixa os filhos na escola ou creche municipal, e volta para casa, cruzando ruas com iluminação que lhe garanta segurança, ele está tendo convívio direto com os serviços prestados pelo Poder Público municipal.
Mas há muitos complicadores neste cenário, porque na maioria dos centros urbanos, o crescimento habitacional é desordenado, para fora do centro rumo às periferias, onde está a população marginalizada. Sem acesso à serviços básicos de infraestrutura, contam com o Parlamento para encaminhar seus pleitos ao Executivo.
Essa tendência decrescimento desordenado e aumento das carências tendem a se acentuar, se levarmos em conta o ritmo de urbanização no Brasil. Ele começa a crescer na década de 40. Mas, hoje, 60% da população brasileira já vivem em cidades. E as estimativas apontam que, no ano 2000, 80% viverão nos municípios. Esta perspectiva torna ainda mais relevante o trabalho da Câmara Municipal para a maioria esmagadora da população brasileira.
Os Municípios, por meio do Legislativo, vêm conseguindo propor ideias inovadoras que correspondem à crescente demanda básica das populações urbanas. É o caso do orçamento participativo, através do qual a população decide onde quer gastar o dinheiro público, as parcerias com a iniciativa privada, que viabilizam projetos sociais, os programas de renda mínima, que têm ajudado a fazer distribuição de renda, e os agentes de saúde, que vêm revertendo a mortalidade infantil.
Cabe à Câmara dos Vereadores garantir a governabilidade da administração de seu Município, assegurando sua continuidade se ela for positiva. Para exercer a contento seu papel de representante do povo, o vereador deve ter grande disciplina partidária para que a ação de minorias não obstrua matérias de interesse da maioria, pois só desta forma parecerá coerente aos olhos do eleitor.
Esta, também, é a melhor forma do político cuidar bem de sua cidade e de sua carreira. Acredito que as ações dos parlamentares sempre são julgadas pelas urnas, por isso precisam demonstrar coerência.
A despeito de seu papel social realçado, os municípios vivem, hoje, uma situação difícil economicamente. Dependem do Fundo de Participação dos Municípios, gerido pelo governo federal e responsável pela maior parte da receita das cidades, e pela cota-parte do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), do governo do Estado. A crise financeira vem sendo agravada não só pela reforma do Estado, mas pela criação de novos Municípios, que levam à divisão do cômputo geral das verbas, cabendo a cada qual menor participação.
Neste contexto econômico, o papel do Legislativo municipal é relevante, à medida que o Município, a exemplo da União, tem atribuições tributárias, arrecada tributos diretos, como o IPTU. Os Municípios, desde a promulgação da Constituição de 88, também puderam cobrar impostos diferenciados sobre veículos e combustíveis. Com a criação destas alternativas de arrecadação, é possível melhorar os serviços públicos essenciais.
As responsabilidades do Município estão crescendo e, paralelamente, as funções dos vereadores. Prova disto é a municipalização da educação no ensino fundamental, definida pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação e pela Emenda 14/96. As atribuições dos Estados estão passando para o âmbito municipal porque é através da descentralização que se abre a possibilidade de governar de forma mais democrática.
O compromisso prioritário da vereança com seus eleitores é a assiduidade aos trabalhos parlamentares nas comissões e plenário. Só assim será possível dar a devida atenção às matérias em votação, geralmente voltadas aos interesses imediatos dos munícipes. A máxima “o poder emana do povo” é atendida pelo voto, porque em nome do povo, o poder é exercido. Quando há essa reciprocidade, fortalece-se o exercício da cidadania, que se configura com a aproximação dos cidadãos dos centros de decisão, como a Câmara.
A exemplo da Câmara Federal, o Legislativo municipal também tem de se manter independente e mostrar sua capacidade de decidir e ser responsável pelos destinos do Município e de seus habitantes. Precisa, por mais fortes que sejam as pressões políticas, manter credibilidade e autonomia para valorizar seu trabalho.
Tem de saber mediar o desejo do povo e do governante, deixando para segundo plano seus interesses pessoais. Até porque o sistema partidário clientelista está em decréscimo no país e deve ser alijado. Também, do âmbito do legislativo municipal, não pode haver transigência quanto ao apoiamento às manifestações sociais, porque este é o caminho mais curto para a modernização da política nacional.
Quando o Legislativo trabalha bem, há o reconhecimento público e a reversão da imagem de morosidade e inoperância que a atuação legislativa acabou cunhando até passado recente. O Legislativo, para ser eficiente, há de ser ágil. Afinal, as funções legislativas precisam acompanhar a dinâmica do desenvolvimento e a premência das demandas sociais. Ocorre que a eficácia do Legislativo, seja federal ou municipal, tende a ser medido pelo número de leis que produzi, o que é uma maneira enviesada de analisá-lo. É como se fosse uma fábrica, com tantas toneladas de produtos manufaturados. Quantidade não é qualidade e esta verdade está ganhando visibilidade para a população.
A Casa Legislativa municipal tem, pelas mãos dos vereadores, a oportunidade de provar que é uma instituição eficiente, voltada a legislar em favor da causa popular. Muitos obstáculos se apresentam às Câmaras Municipais. E soluções têm de ser operacionalizadas para vencê-las no devido tempo. Muitas vezes, esta solução figura na alteração do regimento interno, que deve se adequar à realidade do Município e da Casa Legislativa. Os vereadores necessitam ter suporte legislativo e administrativo para realizar seu trabalho, devendo contar, para tanto, com Mesa diretora eficiente. (Fonte: Câmara dos Deputados)